Pastelaria
de notícias
Todas as
empresas brasileiras falam de crise. Em todos os setores reclamam das quedas
nos faturamentos. Nas empresas de comunicação, a situação não é diferente.
O pretexto é de
que as verbas publicitárias caíram e, por isso, vários veículos de comunicação
estão demitindo profissionais de diversas áreas. Mas acredito que este seja um
bom momento para discutirmos os conteúdos e as formas de produção empregadas no
mercado de comunicação.
Nos últimos 20
anos, estamos assistindo a redução incondicional de pessoal diante da
digitalização de conteúdo. O expurgo se dá por vários motivos entre eles: a
otimização de equipes de trabalho, a não adequação dos mais velhos às novas
formas de produção, a necessidade de reduzir custos de qualquer forma e a
facilidade de utilizarmos mão-de-obra barata dos estagiários, entre outras.
Na base desse
processo, temos sérios problemas de gestão e a tradicional economia
"burra", aquela que não faz uma análise de médio e longo prazo para a
realização de cortes, nem a possibilidade de re-alocação de recursos de forma
ponderada. Os resultados são: equipes desmotivadas, um canibalismo profissional
(alta competitividade contra o trabalho em equipe), a desvalorização dos
profissionais mais maduros por jovens dinâmicos (mas muitos sem conteúdo) e a
queda brutal da qualidade do que produzimos para os veículos de comunicação.
Este quadro
chega às vias da irracionalidade no corte de estruturas mínimas para o trabalho
de diversos profissionais. Entre eles, cito o do repórter. Pode parecer romântico
e piegas, mas acredito que uma boa redação tenha seus repórteres na rua. Ao
contrário do que assistimos atualmente, onde poucas emissoras têm repórteres e
as que mantém um quadro estável de profissionais, força para que eles produzam
suas matérias via fone sem sair das redações. Algumas emissoras chegam ao ponto
de retirarem até o motorista da viatura. Várias delas dão a chaves dos carros
para que os repórteres dirijam até o local da pauta.
Com o avanço da
Internet e das agências de notícias (on line) as emissoras passaram a apenas
reproduzir o que é disponibilizado sem checar a informação ou adaptar a
linguagem às suas audiências. Por isso, fazemos um jornalismo frio, com textos
relaxados, erros de concordância e de dados. As informações locais, que realmente
interessam aos ouvintes, ficam no plano da obrigatoriedade burocrática (cumprem
tabela) e os ouvintes ficam com um pacote de notícias sem sentido, vomitadas de
forma ilógica e sem critério de paginação.
Aproveito para
distinguir conhecimento de informação. Segundo Peter Burke, o primeiro é
quando pegamos os dados e damos a eles sentidos baseados em nossas experiências
pessoais, adaptando estas informações às nossas realidades e balizando nossas
ações. A informação é apenas o dado entregue às pessoas nas mais diversas
formas e veículos.
Na realidade, os
ouvintes são enganados de forma vergonhosa, pois têm a impressão de que estão
sendo informados, mas estão sendo apenas atolados de dados sem nenhum link, sem
a possibilidade de abstrair daquele amontoado alguma informação que realmente
gere conhecimento.
Tudo isso, a
pretexto de termos profissionais multimídia, rápidos, espertos e capazes de
produzir a notícia em vários suportes diferentes no menor tempo possível. O que
acabamos produzindo são profissionais estressados, mal informados e sem a menor
possibilidade de refletir sobre o que estão fazendo. Ou seja, transformamos as
redações em linhas de produção que lembram aquelas pastelarias onde o atendente
grita ao cozinheiro: "Manda dois de carne, um de queijo e três de
pizza". Transformaram notícia em um produto medíocre e sem função... E
ainda querem que nós paguemos por esse conteúdo.
Não sou contra a
tecnologia, nem contra o uso das agencias de notícias. Sou a favor de
colocarmos os repórteres na rua para produzirmos mais conteúdos com qualidade a
tal ponto de termos uma audiência qualificada que ouve o nosso produto porque
sabe do seu diferencial e da importância de ouvi-lo primeiro, mas com a
segurança necessária da investigação jornalística. Sou partidário do repórter
como motor de uma redação e não como um fazedor de pastel.
Dica de Livro
Parte dos
problemas enfrentados pelo radiojornalismo está na falta de uma visão
sistemática do setor, tanto por parte dos empresários como dos profissionais de
redação. Por isso, sugiro a leitura de "Fundamentos do Radiojornalismo"
de Paul Chantler e Peter Stewart. Ambos têm uma boa experiência
em radio, passando por várias emissoras do Reino Unido e principalmente pela BBC.
O livro da Editora
Roca é um manual importante para quem quer entender sobre radiojornalismo
indo além das questões meramente técnicas, abrangendo formatos e dicas de como
fazer bom conteúdo para emissoras noticiosas.
Prof. Alvaro Bufarah, jornalista, especialista em política internacional, mestre e pesquisador sobre rádio
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