quarta-feira, 1 de maio de 2013

Mais um para nossos leitores


Pastelaria de notícias 

Todas as empresas brasileiras falam de crise. Em todos os setores reclamam das quedas nos faturamentos. Nas empresas de comunicação, a situação não é diferente.
O pretexto é de que as verbas publicitárias caíram e, por isso, vários veículos de comunicação estão demitindo profissionais de diversas áreas. Mas acredito que este seja um bom momento para discutirmos os conteúdos e as formas de produção empregadas no mercado de comunicação.
Nos últimos 20 anos, estamos assistindo a redução incondicional de pessoal diante da digitalização de conteúdo. O expurgo se dá por vários motivos entre eles: a otimização de equipes de trabalho, a não adequação dos mais velhos às novas formas de produção, a necessidade de reduzir custos de qualquer forma e a facilidade de utilizarmos mão-de-obra barata dos estagiários, entre outras.
Na base desse processo, temos sérios problemas de gestão e a tradicional economia "burra", aquela que não faz uma análise de médio e longo prazo para a realização de cortes, nem a possibilidade de re-alocação de recursos de forma ponderada. Os resultados são: equipes desmotivadas, um canibalismo profissional (alta competitividade contra o trabalho em equipe), a desvalorização dos profissionais mais maduros por jovens dinâmicos (mas muitos sem conteúdo) e a queda brutal da qualidade do que produzimos para os veículos de comunicação.
Este quadro chega às vias da irracionalidade no corte de estruturas mínimas para o trabalho de diversos profissionais. Entre eles, cito o do repórter. Pode parecer romântico e piegas, mas acredito que uma boa redação tenha seus repórteres na rua. Ao contrário do que assistimos atualmente, onde poucas emissoras têm repórteres e as que mantém um quadro estável de profissionais, força para que eles produzam suas matérias via fone sem sair das redações. Algumas emissoras chegam ao ponto de retirarem até o motorista da viatura. Várias delas dão a chaves dos carros para que os repórteres dirijam até o local da pauta.
Com o avanço da Internet e das agências de notícias (on line) as emissoras passaram a apenas reproduzir o que é disponibilizado sem checar a informação ou adaptar a linguagem às suas audiências. Por isso, fazemos um jornalismo frio, com textos relaxados, erros de concordância e de dados. As informações locais, que realmente interessam aos ouvintes, ficam no plano da obrigatoriedade burocrática (cumprem tabela) e os ouvintes ficam com um pacote de notícias sem sentido, vomitadas de forma ilógica e sem critério de paginação.
Aproveito para distinguir conhecimento de informação. Segundo Peter Burke, o primeiro é quando pegamos os dados e damos a eles sentidos baseados em nossas experiências pessoais, adaptando estas informações às nossas realidades e balizando nossas ações. A informação é apenas o dado entregue às pessoas nas mais diversas formas e veículos.
Na realidade, os ouvintes são enganados de forma vergonhosa, pois têm a impressão de que estão sendo informados, mas estão sendo apenas atolados de dados sem nenhum link, sem a possibilidade de abstrair daquele amontoado alguma informação que realmente gere conhecimento.
Tudo isso, a pretexto de termos profissionais multimídia, rápidos, espertos e capazes de produzir a notícia em vários suportes diferentes no menor tempo possível. O que acabamos produzindo são profissionais estressados, mal informados e sem a menor possibilidade de refletir sobre o que estão fazendo. Ou seja, transformamos as redações em linhas de produção que lembram aquelas pastelarias onde o atendente grita ao cozinheiro: "Manda dois de carne, um de queijo e três de pizza". Transformaram notícia em um produto medíocre e sem função... E ainda querem que nós paguemos por esse conteúdo.
Não sou contra a tecnologia, nem contra o uso das agencias de notícias. Sou a favor de colocarmos os repórteres na rua para produzirmos mais conteúdos com qualidade a tal ponto de termos uma audiência qualificada que ouve o nosso produto porque sabe do seu diferencial e da importância de ouvi-lo primeiro, mas com a segurança necessária da investigação jornalística. Sou partidário do repórter como motor de uma redação e não como um fazedor de pastel. 

Dica de Livro

Parte dos problemas enfrentados pelo radiojornalismo está na falta de uma visão sistemática do setor, tanto por parte dos empresários como dos profissionais de redação. Por isso, sugiro a leitura de "Fundamentos do Radiojornalismo" de Paul Chantler e Peter Stewart. Ambos têm uma boa experiência em radio, passando por várias emissoras do Reino Unido e principalmente pela BBC. O livro da Editora Roca é um manual importante para quem quer entender sobre radiojornalismo indo além das questões meramente técnicas, abrangendo formatos e dicas de como fazer bom conteúdo para emissoras noticiosas.



Prof. Alvaro Bufarah
, jornalista, especialista em política internacional, mestre e pesquisador sobre rádio

Um texto para refletir


A volta do Capitão do Mato 

Você estaria interessado em uma promoção? Sim!!!
Para o cargo é fundamental que seja firme, trabalhe incessantemente mesmo nos seus dias de folga, se for necessário. Este é um cargo de confiança, daqueles que só podemos oferecer a alguém muito especial. O valor do seu salário irá subir em torno de 30%. Para não termos problemas legais, você será demitido e recontratado como uma empresa.
Você tem empresa, não é? Nada precisa mudar na sua relação com as pessoas, só o fato de que você será cobrado pelo trabalho delas. Então, é preciso ser atento a tudo que acontece. Se alguma coisa sair do controle só me traga a solução. Não queremos mais problemas!
Caros leitores, é com este discurso que se contrata os novos chefes nas redações de rádio. Ou melhor, na maioria das redações brasileiras. Com isso, acredito que estejamos em um momento histórico, pois trouxemos de volta uma figura do imaginário coletivo. Não! Não é o bicho papão! Nem a mula-sem-cabeça. Estou falando do velho capitão do mato, aquele sujeito que era pago para capturar negros fugidos e trazê-los de volta para a senzala.
Atualmente, esta função foi delegada a vários chefetes que têm de garantir que a produção da informação ou entretenimento funcione. Tomo o termo (capitão do mato) emprestado de um amigo jornalista, Paulo Vieira Lima, que gentilmente nos brindou com esta definição.
O pior é que ao falar com amigos no mercado, percebo que a cada dia temos mais deles espalhados. Este personagem inescrupuloso e truculento é pago na realidade para manter a ordem dentro das empresas de comunicação. É triste que as entidades de classe, que deveriam nos representar, estão alheias a isso. Também a maioria de nós não vai a nenhuma reunião de instituição alguma. "Não é para menos! Não temos tempo nem de ir na reunião do condomínio", dizem.
Erro crasso dos empresários que não conhecem seus negócios, dos funcionários que aceitam esta situação sem controle e sem respeito e dos elementos que servem a este processo.
Na maioria dos casos, os resultados são satisfatórios durante os primeiros seis meses. Mas ninguém agüenta tanta pressão. Por isso, o número de doentes sobe. Os que fazem corpo mole diminuem o ritmo para poderem dar conta do trabalho que vive sobrando. E o conteúdo vai sendo piorado a cada dia.
Mesmo que se tenha um bom chefe (sujeito raro hoje em dia) teremos outro problema: os burocratas da administração. São aqueles que chegam e tentam reduzir custos de tudo. Porém a realidade funciona de outra forma. Esta economia não irá resultar em nada sem uma boa gestão. Para isso, o administrador tem de conhecer de pessoas, do negócio que está gerenciando e do produto que está fazendo.
Infelizmente, não temos muitos desses no mercado de rádio no Brasil. Basta lembrar aquela história de um diretor de uma grande emissora de São Paulo, que após um erro técnico ficou furioso e foi perguntar o que aconteceu, pois queria a cabeça do culpado. Quando disseram a ele que foi um problema no CUE da mesa, mais que depressa ele sentenciou: Demitam este tal de "QUIU". O fato indica que o pobre gestor não sabia que estavam falando do sub canal da mesa de áudio utilizado para escutar os conteúdos fora do ar.
Então se você está no mercado e se identificou com o perfil acima sugiro que: tente rever seus valores, pense melhor no dia-a-dia e procure aprender a gerenciar melhor suas tarefas, incluindo administrar pessoas com respeito e bom senso. Lembre-se de que você também poderá ser demitido, o que acaba acontecendo quando tudo dá errado.
Nesse momento, perceberá que o seu "pequeno reinado" era não mais do que uma senzala e que você era um número em uma folha de pagamentos. Além disso, este caminho não tem volta, pois todos aqueles que perguntarem sobre você para os seus colegas vão saber seu jeito "sutil". Aí só resta voltar a ser capitão do mato em outra empresa que precisa de seus préstimos. Vida difícil e ingrata, já que amigos serão poucos ou nenhum, a família vai sentir sua ausência e irritação e você viverá uma guerra diária com seus comandados. 

Dica de Livro

Em tempos de grandes discussões sobre o futuro do rádio e a chegada desastrada do rádio digital a sugestão de leitura da semana é a obra do professor Marcelo Kischinhevsky, "O rádio sem onda - Convergência digital e novos desafios na radiodifusão", da E-Papers. Marcelo fez uma pesquisa refinada sobre o processo de digitalização do meio rádio e seus impactos no dia-a-dia das emissoras. Para os leitores que estiverem buscando referencias mais sóbrias sobre os avanços no setor o livro é uma ótima dica. 


 

Prof. Alvaro Bufarah, jornalista, especialista em política internacional, mestre e pesquisador sobre rádio